Mari Hirata (1959-2021)


Foi com sensação de irrealidade que recebemos a notícia da morte de Mari Hirata: nada poderia parecer mais incompatível com a alegria e a vivacidade de Mari do que a morte.

Mari não foi apenas uma das autoras da BEĨ. Ela foi uma interlocutora entusiasmada, interessada, curiosa. Foi sobretudo uma amiga generosa e sempre presente, mesmo quando estava longe, do outro lado do mundo. 

A edição de livro Mari Hirata Sensei, projeto de sua amiga Haydée Belda, nos deu a oportunidade de conhecer melhor a mestra. O livro não é uma compilação de receitas, mas um mergulho no universo de sabores e técnicas utilizados e ensinados por Mari, mediado por Haydée,  sua aluna – e talvez aqui a palavra “discípula” seja mais precisa para definir a relação de admiração, respeito que as uniu e que permeia toda a obra.

O processo de edição estendeu-se por muito tempo: foram meses de encontros, de testes, de ajustes, de experimentações coletivas em diferentes cozinhas. Um livro pensado em todas as minúcias, quase artesanal, como deveria ser o livro dessa autora/protagonista. Houve ainda viagens, inclusive ao Japão, onde Mari foi anfitriã, tradutora, guia. Ali transitava do mercado de peixes ao mais sofisticado restaurante, mantendo a mesma desenvoltura e delicadeza.

Seu trabalho aproximava receitas e técnicas japonesas e brasileiras, e ela própria refletia essa síntese. Era japonesa no rigor e brasileira na afetividade aberta, no sorriso fácil. A esses elementos juntou a influência da pâtisserie, que aprendeu na França. Era impecável em tudo o que fazia. Procurava a beleza em cada gesto: essa busca incessante equivalia a uma declaração de princípios, uma afirmação de vida. 

Pelas mãos de Mari conhecemos chefs que se tornaram também autores e amigos da casa, numa multiplicação de vínculos alimentada pelo seu temperamento agregador.

Hoje, essa rede de afetos nos sustenta e conforta. E nos mostra que Mari permanece conosco de muitas formas – no trabalho, nos afetos, nas  descobertas, nas grandes conquistas e nas alegrias miúdas. Uma amiga generosa e presente, sempre.   


“Sua culinária elegante revela um profundo intelecto/ resulta de inteligência baseada em conhecimento, paixão e generosidade/ de ingredientes e conhecimento das reações químicas/ de perseguição apaixonada da perfeição/ de flexibilidade para  mudanças repentinas.” Yukiko Kurokawa, professora na Escola de Psicologia da Universidade Sofia, Tóquio, em poema presente no livro Mari Hirata Sensei

“Serena, engraçada, um dínamo extraordinário com uma disposição inesgotável. [...] Alguém que tem horror a qualquer excesso e a todo o supérfluo, na mesma proporção em que preza a informação precisa e indispensável.” Haydée Belda, emMari Hirata Sensei